Em 2019, a semana em que o presidente Jair Bolsonaro retirou o incentivo ao turismo LGBT+ no Brasil do Plano Nacional de Turismo e em que viralizou uma fala da ministra Damares Alves chamando princesas da ficção de lésbicas em tom pejorativo foi a mesma em que se celebra o Dia Nacional de Combate à Homofobia, em 17 de maio. Membros do movimento LGBT+ aproveitaram a ocasião para se reunir com parlamentares em Brasília para articular políticas que garantam os direitos dessa população e que contribuam no combate à LGBTfobia.
Na Câmara dos Deputados houve uma audiência pública sobre o tema na quarta-feira (15/05), na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Casa. No dia seguinte, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado debateu políticas públicas de combate a crimes contra a população LGBT+. Deborah Duprat, atual Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, foi uma das autoridades presentes.
Aliada do movimento LGBT+ desde sua passagem pela chefia da Procuradoria-Geral da República, ela disse respeitar a estratégia atual dos movimentos em criminalizar a LGBTfobia.
“Tenho muitas reservas em relação ao Direito Penal regulando a sociedade, mas eu acho que se é para punir alguma coisa, não tem nada mais abjeto do que atacar uma pessoa por ser o que ela é. É uma estratégia eleita pelos movimentos e respeito muito isso”, afirmou.
Presidente da Rede TransBrasil, Thatiane Araújo destacou, em entrevista à Gênero e Número, que o primeiro movimento é, sim, a criminalização, mas não pode parar neste ponto. A ONG presidida por Araújo contabilizou 23 assassinatos por motivação transfóbica até março deste ano – entre eles o de Quelly, em Campinas, que teve seu coração arrancado.
“Não é normal o STF [Supremo Tribunal Federal] abrir o caminho da cidadania para nós quando os representantes do povo estão no Legislativo. Existe claramente uma perseguição da pauta LGBT. É uma negligência perversa de quem não quer discutir o progresso da sociedade”, avalia. “Os projetos de lei que não avançam são também uma forma de matar socialmente essa população. A criminalização pelo menos mostra que o Estado brasileiro reconhece que não pode assassinar física ou socialmente essas pessoas [LGBT+].”
Paralelamente à discussão no Supremo, o projeto de lei 672/2019, de autoria do senador Weverton (PDT/MA), pode avançar em Brasília. Ele propõe alteração da lei 7.716/1989, que trata sobre os crimes de preconceito de cor e raça, para que se inclua o preconceito também por orientação sexual ou identidade de gênero, o que significa criminalizar LGBTfobia.
A lei original garante pena de até quatro anos a quem a desrespeitar, a depender do preconceito a que a vítima seja submetida. O relatório sobre o PL 672/2019 deve ser votado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado até o dia 24 de maio.
Segundo ativistas presentes na audiência, os ataques do governo federal à população LGBT+ não são suficientes para impedir os avanços conquistados nos últimos anos.
“Estamos momentaneamente numa conjuntura de dificuldade total no Executivo, numa dificuldade parcial no Legislativo, mas temos muito apoio no Judiciário”, disse Emerson Santos, conselheiro do CNCD/LGBT/MDH (Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos). “Atuamos nas aberturas que encontramos em alguns poderes. Temos alguns aliados. E além disso, temos as ações disruptivas, de rua, de pressão e de mobilização social. O empoderamento da população LGBT+ é uma forma de combater esse retrocesso.”
*Lola Ferreira é jornalista e colaboradora da Gênero e Número.